[Poema II]
O ensurdecedor barulho dos disparos
Atinge o mundo como trovoada
Chuva e correntes marítimas
Naufragam em soluços travados
Somos homens de carne e osso,
Mas a desistência da vida é o palpitar da fraqueza
Porque somos incertos como o tempo
E tentamos manter a sanidade emocional
Lutamos por ver o céu e as estrelas luminosas
Corremos entre terras movediças e desviamos
Sentamo-nos à beira rio e somos serenidade
Amamos e destruímos com laços apertados de adoração
Ateamos o fogo da paixão a um cordel oleado
Variamos os passos na distância que separa o Céu do Inferno
Atingimos, finalmente, o espaço cinzento e apagamos
A luz vermelha acende e o chão rebenta em mil pirilampos
A água que transborda a alma bate como asas que se abanam
Os leques e a moldura da tela que os pinta agitam o vento
Apaziguam a queimação intrínseca e decadente
Somos almas desafortunadas que caíram e ficaram
Perdidas da multidão que atravessa a ponte e bloqueia o caminho
Somos homens de indignação e discernimento rasgados ao meio
Fragmentos de rocha que o Sol quebrou e o mar levou
Somos dias vazios que se unem em intemporalidade vadia
O coração é pendericalho ao peito, que exibe dor e saudade
O sentimento puro e caloroso, esse, o maldito não tem
Mata e afugenta para se guardar sem que o achem
Apaga a luz e cobre a face com lençóis brancos para que a manhã não seja
Ser pessoa que desagrada ou coisa que não é digna de percepção?
Desesperar no lume da fogueira com o rosto limpo ou observar de longe a punição?
A injustiça e a auto-preservação dominam o ciúme de nascer-se pó
Encarar o ouro e sentir-se bronze descascado, mas protegido
Descrever as garras com suavidade fingida
Cortar o pulso e apreciar a corrente desaguar
As marés e as fases lunares que somam desalento
Ajeitam-se em superação infindável de loucura
Pedir ao corpo que caminhe descalço sobre vidros
Torturar a vista com demasiado realistas ilusões
Agitar o copo e virar o mundo ao contrário
Sorrir à câmara e perder-se em vastidão oceânica
A conclusão? A finalidade é a descoberta que somos diferentes
As palavras e o sentimento alinham e desalinham como planetas
O sol, ora brilha, ora presenteia com escuridão solene
Mas nunca, em parte alguma, se viu um Deus tão requisitado.